Vanguardas artísticas: o primeiro manifesto futurista

Logo abaixo, trechos do primeiro manifesto futurista, de 1909, assinado por Marinetti (uma das principais lideranças deste movimento artístico na Itália). Nele, a sedução pelo moderno é afirmada na positivação da sociedade industrial: suas máquinas, sua velocidade, seu poder de destruição (daí, inclusive, o elogio à guerra, "higiene do mundo"). O manifesto canta o futuro que a era das máquinas prometia, indo contra tudo o que parecia representar o passado e impedir a inovação (o apego à história, às tradições, os museus). 
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Manifesto do Futurismo (Filippo Tomaso Marinetti, 1909)

[...]
1. Nós queremos cantar o amor ao perigo, o hábito da energia e da temeridade.
2. A coragem, a audácia, a rebelião serão elementos essenciais de nossa poesia.
3. A literatura exaltou até hoje a imobilidade pensativa, o êxtase, o sono. Nós queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, o passo de corrida, o salto mortal, o bofetão e o soco.
4. Nós afirmamos que a magnificência do mundo enriqueceu-se de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um automóvel de corrida com seu cofre enfeitado com tubos grossos, semelhantes a serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais bonito que a Vitória de Samotrácia.
[...]
7. Não há mais beleza, a não ser na luta. Nenhuma obra que não tenha um caráter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças desconhecidas, para obrigá-las a prostrar-se diante do homem.
8. Nós estamos no promontório extremo dos séculos!... Por que haveríamos de olhar para trás, se queremos arrombar as misteriosas portas do Impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Nós já estamos vivendo no absoluto, pois já criamos a eterna velocidade onipresente.
9. Nós queremos glorificar a guerra - única higiene do mundo - o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos libertários, as belas idéias pelas quais se morre e o desprezo pela mulher.
10. Nós queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academias de toda natureza, e combater o moralismo, o feminismo e toda vileza oportunista e utilitária.
11. Nós cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela sublevação; cantaremos as marés multicores e polifônicas das revoluções nas capitais modernas; cantaremos o vibrante fervor noturno dos arsenais e dos estaleiros incendiados por violentas luas elétricas; as estações esganadas, devoradoras de serpentes que fumam; as oficinas penduradas às nuvens pelos fios contorcidos de suas fumaças; as pontes, semelhantes a ginastas gigantes que cavalgam os rios, faiscantes ao sol com um luzir de facas; os piróscafos aventurosos que farejam o horizonte, as locomotivas de largo peito, que pateiam sobre os trilhos, como enormes cavalos de aço enleados de carros; e o vôo rasante dos aviões, cuja hélice freme ao vento, como uma bandeira, e parece aplaudir como uma multidão entusiasta.
É da Itália, que nós lançamos pelo mundo este nosso manifesto de violência arrebatadora e incendiária, com o qual fundamos hoje o ‘Futurismo’, porque queremos libertar este país de sua fétida gangrena de professores, de arqueólogos, de cicerones e de antiquários. [...]
E venham, pois, os alegres incendiários de dedos carbonizados! Ei-los! Ei-los!... Vamos! Ateiem fogo às estantes das bibliotecas!... Desviem o curso dos canais, para inundar os museus!... Oh, a alegria de ver boiar à deriva, laceradas e desbotaadas sobre aquelas águas, as velhas telas gloriosas!... Empunhem as picaretas, os machados, os martelos e destruam sem piedade as cidades veneradas! [...]
Vocês nos fazem objeções?... Chega! Chega! Conhecemo-las... Compreendemos... nossa bela e mendaz inteligência nos afirma que somos o resumo e o prolongamento de nossos ancestrais. - Talvez!... Que seja!... Mas o que importa? Não queremos entender!... Ai de quem nos repetir estas infames palavras!...
De pé sobre o cume do mundo, nós lançamos, mais uma vez, nosso desafio às estrelas!...

Fonte: BERNARDINI, Aurora F. (org.). O Futurismo Italiano: manifestos. São Paulo: Perspectiva, 1980. p.33-36.

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